quinta-feira, 30 de outubro de 2008

dizem que podemos
aprender a vida
de dois modos:
pela dor
ou pelo amor

de certo que podemos
mas, aprendemos mesmo
é na mistura
dos dois

pois há quem ame
sem sentir dor
ou alguém ferido
sem um coração
pardido?

amor e dor
são complementos
da plenitude

não há transfiguração
sem distúrbio

terça-feira, 28 de outubro de 2008

calo ao sentir

a tua carência

de fala:


faz-se

um calo

em meu

coração

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

decorei pelas noites de insônia

os meandros do teu rosto

traço por traço

linha por linha

perfeição por (in)perfeição


mas, agora que o tenho pronto

nos mínimos e nos máximos

detalhes entalhado

a contemplação

tornou-se insossa

já que falta

a tua alma

domingo, 26 de outubro de 2008

(pisco)análise

a palavra é um espelho
atitude de desespero
do poeta em conflito
perdemos, segundo a segundo
as palavras, os sentidos, as verdades
e nos embrutecemos

absortos na canção
da ignorância, do egoísmo
das necessidades veladas
dos contratempos
injúrias, calúnias
ferimentos
agonia

somos o auge
de uma espécie
em ruinas

sábado, 25 de outubro de 2008

a tua imagem que vem em meus sonhos
tão real e densa que penso estar desperto
é a imagem que sustenta o Universo

mas, me pergunto:
o Universo é feito assim
desse tecido da incompletude?
como se nada ou ninguém
fosse capaz de romper a rede
do poema que dizia:
Pedro amava Joana, que amava...
... e que não amava ninguém...

enfim, é um golpe
é uma cicatriz
é uma ruga
é o tempo

Há alguma coisa nesta noite

Que não sei explicar

Um ar rarefeito, prestes

A precipitar...


Recolho os fragmentos da rua

Como se ao juntá-los

Resolveria-se o mistério da vida:

as partes do quebra-cabeça

que findariam em meu peito

a vontade de chorar


Os concretos quentes

O asfalto gasto

O tempo indeterminado

Pessoas sós, aos pares

Aos bandos...

E os minúsculos e macros

Barulhos intermitentes


A noite que não se explica

Nem pelo seu nome

Nem pela sua existência

Existe aí mesmo

No intervalo dela

Com alguma outra coisa

Que é minha, que foi minha

E eu deixei passar...

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

terça-feira, 21 de outubro de 2008

de fato, não é estar só
nem acompanhado
é não estar
exatamente
ao teu lado


mas, ao de quem?
ao lado de quem?


de você? de você
que passa impassível
irredutível
ignóbil?

de você? é?

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

a verdade é que tempo de hoje
não será o tempo de amanhã
parece óbvio? parece...

acontece que o tempo de agora
é uma estufa
que nos faz suar o sangue
das metodologias absurdas
de uma civilização em ruínas

o tempo de amanhã
depois da tempestade do século
surgirá como calmaria
transfigurando o que
nos torna brutos
em eternidade de sentidos
que agora as palavras
só podem se referir
em apunhaladas

o tempo de amanhã
permitirá o suspiro aliviado
será quando saberemos
que não somos culpados
pelo delito, pela ferida
pelo assassinato...

o tempo de rasgar
os papéis da burocracia
que matém a ordem
desumanizante

o tempo das hierarquias
serem subvertidas
pelas ordens de outras pessoas
de gestos mais coerentes
do compartilhamento
de responsabilidades

o novo tempo, que já disponta
em surdina e tormento
para os vagloriados de agora
será o tempo intimista
entendido pelas crianças
pela inocência, confiança, poesia

ah! tempo que nos falta
e nos comove...

domingo, 12 de outubro de 2008

murcho aos poucos
pelas faltas, ausências
saudades...

meu coração
de papel
se amassa
a árvore florida
de amarelo:
o sexo exuberante e belo

e qual a contrapartida
que damos nos à vida?

entragamo-nos as
dores repentinas
mas sempre é
uma tentativa
de ser feliz...

flores amarelas
são sexos divinos
e nós ficamos
com profanos

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

las horas más intensas
que pueden ser vividas
son aquellas en que nada
puede ser dicho o escrito

como dijera una poeta:
vivir ultrapasa
todo entendimiento*

* Clarice Lispector escreveu:

Não se preocupe em entender. Viver ultrapassa todo entendimento. Renda-se como eu me rendi. Mergulhe no que você não conhece como eu mergulhei. Eu sou uma pergunta.


? Mas, será mesmo ?

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

o tempo muda o rumo do vento
ameno, intenso, sagrado
minhas velhas imagens
desgastadas
meus novos modos
de felicidade

a cidade é sempre outra
o relógio, as maçãs
desidratadas
uvas passam
versos ficam

meu lugar favorito
é, ainda, teu coração
noite, cedo, cinco minutos
e tudo é menos
solidão

domingo, 5 de outubro de 2008

de fora do beco de nossas cavernas mentais
tudo parece difícil, estranho, ameaçador
o que não é reflexo
não é para ser...

sábado, 4 de outubro de 2008

olho-te no impasse dos teus olhos
espelhos dos meus devaneios
olho-te e liberto o veneno
da minha poesia
ética-estética da existência
em pequenos segundos
perdidos nessa
observação

deixo de amar o tempo
em que fui a esperança
de encontrar soluções
nos vales de lágrimas

deixo o teu coração
em contato com a agulha
que fere meus olhos
que te olham pela fresta
do cantinho do dia
um segundo
menos
e pá!

angústia elevada
necessidade de achar
que vale a pena ser
ainda ser o que se é!
identidade?

olho-te no esboço
olho-te no meio
nunca inteiro
nunca para sempre
olho-te de escanteio
meia boca
sem intenção de nada
apenas criar
alguma alegria/tristeza
para, enfim
deixar de lado
toda felicidade
e ser o mesmo
de sempre
vai dizer que não sabia
vai dizer...

tudo bem, eu imaginei
que poderia ser
alguma coisa do tipo
amor transcedental

mas, na real
o que eu preciso mesmo
é começar a usar
o fio dental

(evita tártaro
diz o meu dentista)